  
"Batman",
de Tim Burton (1989)

No
seu 200ª aniversário, Gothan City assiste Batman,
ou Bruce Wayne, interpretado por Michael Keaton, enfrentar o
Coringa, ex-executivo e gangster da corporação
Axis Chemical. Numa Gothan City de estilo dark,
quase gótico, Tim Burton nos apresenta uma sociedade
burguesa degradada pela corrupção policial, abusos
ambientais, excessos corporativos, ganância e imprensa
sensacionalista e manipulada. Batman, o homem-morcego, é
a proteção da sociedade civil diante
da inoperância policial. Em face da crise social e do
Estado, apela-se para o extraordinário: o herói
Batman. É interessante o seguinte diálogo entre
a jornalista Vicki Vale, interpretado por Kim Bassenger, e Batman:
o homem-morcêgo diz que o Coringa, seu arqui-rival, é
psicótico. Vicki observa: "Algumas pesoas dizem
o mesmo sobre você". E arremeta: "(...) você
não é exatamente normal, é?". Batman
responde: "Não é exatamente um mundo normal"
(vide acima). Enfim,de certo modo, Batman e os super-heróis
expressam tão-somente a anormalidade do mundo
do capital. Eles tendem a expressar a representação
fantástica dos anseios de controle social diante de um
mundo anormal e descontrolado (é o desejo de
vingança de Bruce Wayne, empresário de estilo
aristocrático, contra os assassinos de seus pais por
ladrões de rua, que irá fazê-lo se transfigurar
no justiciero Batman). [topo]
(2004)
  
“Bom
Dia”, de Yasujiro Ozu (1959)

Num
tranqüilo bairro da periferia de Tóquio, dois garotos,
os irmãos Isamu e Minoru, pedem aos pais que comprem
uma TV. Os pais se recusam, e em represália eles fazem
uma greve de silêncio. Bom Dia é uma sátira
encantadora da vida familiar suburbana do Japão dos primórdios
da década de 1960. É perceptível a transição
para a vida moderna, com seus novos aparatos tecnológicos
(a TV e a máquina de lavar, por exemplo) e os novos costumes
que se contrasta com a sociedade tradicional no Japão.
Dirigido com graça e sensibilidade apurada, quase num
estilo de contemplação zen, por Yasujiro
Ozu, um dos grandes cineastas japoneses, Bom Dia expõem
as mudanças impostas pela vida moderna: crianças
impertinentes, que desafiam a autoridade do pai, mero trabalhador
assalariado; filhas que não querem se casar, para não
deixar solitário, o pai viúvo; a dificuldade de
comunicação entre casais; o drama de aposentados
e desempregados sem perspectiva de vida. Através de um
humor sutil, quase no estilo de um Jacque Tati (em Mon Oncle),
Ozu expõe, com graça e leveza, as contradições
candentes de um Japão que se moderniza a largos passos
no período histórico de ascensão do capital.
Mais tarde, sob a crise estrutural do capitalismo no Japão,
a graça e a leveza da critica da modernidade no Japão,
iriam dar lugar, por exemplo, à grosseria sinistra e
contundente dos filmes de Takichii Miiki (vide Visitor Q).
[topo]
(2005).
  
“Brinquedo
Proibido”, de René Clement (1952)
Durante
um bombardeio, a pequena Paulette, de cinco anos, fica orfã.
Ela é adotada por Michel, um menino de 11 anos, filho
de camponeses. Paulette passa a morar com a família de
Michel. Depois de enterrar o cachorro de Paulette num velho
moinho abandonado, as duas crianças aos poucos vão
construindo um verdadeiro cemitério de insetos e pequenos
animais. As duas crianças vão estabelecer uma
amizade singela e pura, mas fragilizada pela presença
da morte e da incompreensão. Em pleno cenário
da guerra e da loucura dos adultos (vide a briga estúpida
entre as duas famílias de camponeses), Paulette e Michel
constroem um mundo imaginário à parte, inclusive
atentando contra as tradições sagradas da Igreja
(Michel furta várias cruzes do pequeno cemitério
local para colocar no cemitério de insetos e pequenos
animais). Clement expõe, de forma lírica, o contraste
da inocência singela das crianças, imersas em suas
fantasias, e a barbárie dos adultos, imersos na guerra
e nas intrigas provincianas. Acima, Paulette implora a Michel
para não matar um pequeno inseto.
[topo]
(2005)
  
“Billy
Elliot”, de Stephen
Daldry (2000)

Billy
Elliot (interpretado por Jamie Bell) é um menino de onze
anos, filho de mineiro de carvão do norte da Inglaterra,
que, em plena greve dos mineiros de 1984, decide ter aulas de
ballet com a Sra. Wilkinson (Julie Walters). Billy se escondendo
do pai viúvo e do irmão, ambos participantes ativos
do movimento grevista. Mas logo seu segredo vem a tona e suas
esperanças são barradas. Entretanto a paixão
de Billy pela dança e seu talento são reconhecidos
pelo pai que o leva a inscrever-se no Royal Ballet
em Londres. O filme de Daldry busca exprimir de forma alegórica
a transição de uma época histórica
para outra (este é, por exemplo, o mesmo tema de The
Full Monty, de Peter Cattaneo, realizado em 1997 e que
utilizou o mote da flexibilização do corpo
para traduzir as novas disposições de subjetivação
do capital pós-fordista). Billy é o contraste
pessoal de seu irmão mais velho, Tony Elliot - enquanto
ele é mineiro e sindicalista, vinculado à sociedade
industrial de velho tipo, das minas de carvão e da indústria
de chaminé; Billy, por outro lado, é o jovem talentoso
e sensivel, entusiasmado pela arte do ballet, cujas qualidades
pessoais (e a escolha profissional) estão ligadas à
denominada "sociedade pós-industrial de serviços".
No decorrer da década de 1980, o choque neoliberal de
Margaret Thatcher no Reino Unido implicou a construção
sócio-pessoal, no plano ideológico-valorativo,
de um novo homem (e uma nova sensibilidade) pós-fordista
vinculado às demandas das novas formas de exploração
do capital, ligado à atividade de serviço. O que
The Full Monty e Billy Elliot buscam expressar
é que o neoliberalismo é muito mais do que uma
política de gestão do Estado capitalista; é
também um novo modo de vida (e de sensibilidade) social
que busca descontruir uma determinada forma histórica
de luta de classes. A força da ideologia individualista,
onde o sucesso pessoal está ligado a talentos individuais,
e não a movimentos coletivos, é flagrante em Billy
Elliot, mais do que em The Full Monty, que mantém
ainda, de certo modo, uma perspectiva de empreendimento coletivo.
Na foto acima, Billy vislumbra o horizonte, tendo ao fundo o
outdoor que conclama mineiros para greve na Inglaterra
thatherista.[topo]
(2005)
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